Guitarra perde espaço com aumento do uso de elementos eletrônicos  | Foto: Reprodução / Facebook / CP

Guitarra perde espaço com aumento do uso de elementos eletrônicos | Foto: Reprodução / Facebook / CP

“Na verdade, eu queria ter mais concorrência.” O sorriso do outro lado do telefone não muda em nada um certo ar de lamento. Tom Morello é um dos maiores guitarristas da atualidade e esteve em bandas renomadas, e finadas, como o Rage Against the Machine e o Audioslave. Só que o músico norte-americano sabe melhor do que ninguém que, hoje, figuras míticas como ele são cada vez mais raras. Há algumas décadas convencionou-se chamar de guitar heroes aqueles que dominavam não apenas o instrumento elétrico, como também a plateia. O problema é que os anos foram passando e as coroas continuaram nas mesmas cabeças, com raríssimas exceções. Eric Clapton, Jimi Hendrix, Jimmy Page, Eddie Van Halen, Slash. Todos absurdamente talentosos. A grande maioria, verdadeiros dinossauros para uma geração que, em 2012, se perguntava no Twitter quem era aquele senhor de branco a se apresentar na premiação do Grammy. Aquele senhor era Paul McCartney.

Os tempos estão mudando, já diria Bob Dylan. E com eles, muda também toda a cultura ao redor. Portanto, seja você, amigo leitor, fã de Beatles ou não, contenha o rancor com as gerações que desconhecem um dos quatro integrantes daquela banda famosa de Liverpool e atente para o fato de que nos últimos anos os parâmetros da música mudaram. Não um, não dois. Todos. Ou, pelo menos, quase todos. A música não é mais criada da mesma forma, não é mais distribuída da mesma forma e sequer é consumida da mesma forma. Tantas mudanças não aconteceriam sem consequências. Se, no início dos anos 2000, a indústria fonográfica foi sacudida com os programas de compartilhamento gratuito (ou ilegais, como você preferir) de arquivos musicais como o Napster, outra revolução, essa bem mais recente, aconteceu a partir da proliferação dos serviços de streaming. Mas é claro, houve vítimas no meio do caminho. E a guitarra foi uma delas.

Neste sentido, não há nada tão representativo como a falência, em maio de 2018, da Gibson, uma das mais famosas fabricantes de guitarras de todo o mundo. Há alguns anos, seria inimaginável cogitar que a empresa poderia ir à bancarrota. Logo a Gibson, ela própria um ícone de 124 anos que produziu modelos que ficaram famosos nas mãos de astros do porte de Slash, do Guns ‘N’ Roses, e Pete Townshend, do The Who, ambos com uma linha própria da marca; e de B.B. King e sua Lucille, ela mesmo uma Gibson customizada. Curiosamente, foi justamente a tentativa de se adaptar aos novos tempos que acabou sendo o trágico passo em falso da centenária companhia de Nashville. A partir de 2012, ela resolveu expandir seu alcance e investiu na compra de empresas ligadas a aparelhos de áudio eletrônicos, a ponto de dois anos depois pagar 135 milhões de dólares em uma destas negociações. O passo foi maior do que a perna e, com 500 milhões de dólares de dívida, não restou outra alternativa a não ser o pedido de falência neste ano.

A derrocada de uma das gigantes trouxe de volta ao mercado uma questão que parece nunca sair de moda: o rock acabou? Ainda que a resposta mais simples e verdadeira seja “não”, é preciso se admitir que, bem, ele deixou de ser tão relevante. E isso, unido a outros fatores, fez com que a venda de guitarras em geral caísse nos últimos anos. Se em 2012, o número de unidades vendidas no Brasil beirava os 19 mil, em 2017 pouco passou de 5 mil. Feiras tradicionais como a ExpoMusic, que por 34 anos foi anual, neste ano não acontecerá. Os expositores consideraram o mercado desaquecido e preferiram adiar para maio do ano que vem. Para o presidente da Associação Nacional da Indústria da Música (Anafima), é preciso contextualizar a questão toda. “Essa queda aparece graficamente nas importações, mas se deu por alguns motivos muitos claros. Nesses últimos anos, o dólar baixou demais e nessa baixa se comprou muito. Aí veio a crise de 2014 e isso diminuiu em qualquer setor. Hoje, o mercado voltou a um pico de estabilidade. A bolha não existe mais. O mercado caiu, mas está voltando ao seu crescimento”, assegura Daniel Neves.

Enquanto nos anos 1960 e 1970 guitarristas como Jimi Hendrix eram idolatrados, o número de guitar heroes hoje é bastante escasso CP MEMORIA

Enquanto nos anos 1960 e 1970 guitarristas como Jimi Hendrix eram idolatrados, o número de guitar heroes hoje é bastante escasso

Tal cenário é confirmado se levado em conta o âmbito regional. Gerente da unidade de Porto Alegre da Made in Brazil, uma das principais lojas de instrumentos musicais do país, Vinícius Castro diz que se mostrou surpreso quando foram divulgados os dados de declínio. “Para nós, quando saiu essa notícia, não mudou nada. Vendemos 22% a mais de guitarras em relação ao ano passado”, observa, revelando ainda que nos últimos meses se verificou um crescimento na procura por aparelhos mais caros, ao contrário de 2015 e 2016, anos apontados como mais complicados. De quebra, uma outra surpresa. Em meio à entrevista, Vinícius interrompe uma pergunta para devolver outra: “Sabe qual é hoje o meu maior concorrente na venda de guitarras? Videogames. A geração mais nova não tem muita paciência para aprender, a não ser algo que prenda muito a atenção. Temos muitos casos, principalmente em épocas como o Natal, de gente que vem aqui, olha o instrumento e até mostra interesse. Mas quando a mãe ou o pai diz que é isso ou o videogame, acaba escolhendo um Playstation 4”. 

A revelação encontra respaldo em números. Enquanto ao investir em jogos como Fifa ou Call of Duty a satisfação é imediata, a guitarra – e qualquer outro instrumento – demanda tempo e paciência. Ambos em doses cavalares. Um estudo realizado em 2015 pela Fender, concorrente da Gibson, mostrou que 90% das pessoas que tentam aprender a tocar guitarra desistem logo no primeiro ano. Além das razões já citadas, existem outros motivos, inclusive

financeiros, visto que o pacote precisa ser complementado com outros acessórios, como amplificadores e pedais. E nenhum deles é barato. “Violão sempre vendeu mais do que guitarra, no mundo todo, não só aqui. Porque a guitarra demanda outras coisas, um amplificador, um pedal, uma manutenção diferente”, explica Vinícius Castro. O próprio preço da Gibson de certa forma é um dos fatores que pode explicar a queda nas suas vendas. Uma rápida pesquisa em sites de lojas de instrumentos da Capital mostra que o modelo mais barato, uma SG Special, não sai por menos de R$ 6,8 mil, mas há outros modelos que chegam a custar R$ 29,5 mil. Afora isso, os músicos profissionais tendem a comprar seus modelos no exterior. Para completar, replicando o que já acontece em outras áreas da economia, empresas chinesas e coreanas têm apresentado modelos melhores que no passado e que, se não alcançam a qualidade de uma Gibson ou uma Fender, seduzem na relação custo-benefício.

“(A queda das vendas) Não me surpreende, mas ao mesmo tempo entendo que ainda existe dentro do showbizz internacional muita banda de rock tocando, muita gente jovem que está aprendendo e sonha em ter uma guitarra Fender, uma Gibson. Enxergo as duas coisas acontecendo: uma profusão de estilos surgindo que não usam guitarra, mas isso não significa que os artistas não necessitem de boas guitarras. Se você quer trabalhar com música, cedo ou tarde você vai precisar trabalhar com uma guitarra de qualidade”, analisa o músico e coordenador do curso de Produção Fonográfica da Unisinos, Frank Jorge.

MC Kevinho é um dos nomes mais famosos da atual cena funk no Brasil e alguns de seus vídeos no  YouTube têm mais de 779 milhões de visualizações LÉO CALDAS/ DIVULGAÇÃO

MC Kevinho é um dos nomes mais famosos da atual cena funk no Brasil e alguns de seus vídeos no
YouTube têm mais de 779 milhões de visualizações

Seja com vendas maiores ou menores, a questão não se prende a um possível desaparecimento de cena da guitarra, longe disso. Primeiro porque ela continua bem presente. Segundo, porque, na verdade, aqui o uso da palavra vai muito além do instrumento em si. Trata-se sim do que ele representou para toda uma cena, principalmente entre os anos 1960 e 1970. Os acordes de Hendrix, de Page e de muitos outros na época miravam muito mais do que apenas notas. Traziam consigo todo o peso de um tempo de contestação. E nesse quadro, a performance e a presença de palco eram tão importantes quanto a qualidade em si. Pete Townshend quebrando tudo após uma apresentação no Festival Monterey Pop, em 1967. Jimi Hendrix botando fogo na própria guitarra no show que veio em seguida. Por isso tanta idolatria. Acontece que, de uns anos para cá, se a qualidade dos guitarristas não caiu, o papel de ídolo e mesmo o de contestação, foi sendo ocupado por novos representantes.

E eles não necessariamente lidam com cordas e amplificadores. “Hoje a galera está muito mais acomodada, é muito mais comodista para protestar. Esse papel hoje ficou com o pessoal do rap”, observa o músico Marcelo Gross. “O mundo hoje está bem diferente. Contestar o quê? Lógico que tem muita coisa errada, mas o pessoal está tão dividido politicamente que se tu contestares uma coisa, a outra metade fica braba. Estamos vivendo uma época muito maluca. Virou uma coisa complicada contestar hoje, tomar partido. Acho que isso é reflexo dessa época mais sonsa que estamos vivendo, onde a galera está mais acomodada”, completa Gross, um dos fundadores da banda Cachorro Grande e que hoje segue carreira solo. A análise faz todo sentido, basta lembrar que, no cenário internacional, quem mais contesta questões de gênero, racismo e violência policial, por exemplo, são nomes como Beyoncé, Kendrick Lamar e Childish Gambino, todos ligados ao cenário do hip-hop.

Assim, a importância musical da guitarra permaneceu a mesma. O seu poder como ícone, contudo, não. “Leio da seguinte forma. Ser icônico ou não é quando existe uma força humana real. Existe músico e existe artista. Existem artistas que também são músicos. Ivete Sangalo, por exemplo, é artista e musicista. A guitarra vai conseguir ter de volta o protagonismo quando um artista guitarrista ganhar o espaço. A guitarra em si não comunica. Ela precisa do músico, que precisa ter esse brilho”, afirma Daniel Neves. Gross vê com otimismo a possibilidade de que o rock, e com ele a guitarra distorcida, recupere esse terreno.

Aplicativo de musicas

Aplicativo de musicas

Para o músico, é uma questão de tempo: “Desde que foi inventada, a guitarra elétrica de tempos em tempos sai de moda e volta. De uns anos para cá, a importância dela e do guitar hero diminuiu porque não apareceu nenhum. O que está faltando é um ícone como, por exemplo, apareceu o Slash no final dos anos 1980, início dos 1990, ou mesmo o Kurt Cobain, da maneira dele”. Ele avisa, contudo, que quem aposta na morte do rock está fadado a se enganar: “A gente precisa lembrar que a primeira gravadora que os Beatles bateram, que foi a Decca, disse não, alegando que bandas de guitarra estavam fora de moda, e aí deu no que deu, né?”. É.

Se a guitarra foi para o fundo do palco e deixou os holofotes lá na frente, quem então os ocupou? O mais justo seria afirmar que houve uma descentralização e que, hoje em dia, ninguém reina sozinho. Contudo, é visível que elementos eletrônicos cada vez mais tornam-se presentes no cenário musical, desde a sua concepção. “A arte da música em si não evolui, ela está sempre em transformação, e talvez isso seja percebido como ciclos. O uso desses elementos eletrônicos é mais uma tendência do que um nicho, mas a música hoje é muito fragmentada, não existe um estilo dominante”, indica o compositor e professor da Ufrgs, Eloy Fritsch, que completa: “Antes era necessário o músico trabalhar com um grupo, hoje em dia vemos produtores trabalhando com um artista só e fazendo tudo. São novas possibilidades. Essa nova geração já nasceu na era digital e consegue lidar bem mais facilmente com essa tecnologia, acaba incluindo esse conhecimento na música”. Isso é viável por uma série de programas e aplicativos.

Em programas como o Garage Band, que vem junto dos produtos da Apple, por exemplo, basta que o usuário tenha uma mínima noção de tempo e compasso para criar uma música. Sem tocar absolutamente nada, apenas selecionando trechos pré-produzidos de diversos estilos musicais, nasce o trabalho. Em menos de 15 minutos, uma canção pode ser criada e divulgada em sites como SoundCloud ou YouTube. Pronto, o mundo inteiro conhece o seu trabalho. Mesmo que você não faça a menor ideia do que é um ré, um dó ou um fá.

Isso não significa, no entanto, que a música passa por uma curva descendente em termos de qualidade. O gráfico mais adequado, na verdade, seria outro, indicando caminhos para todos os estilos e, em cada um deles, bons e maus trabalhos. “Quem não conhece música provavelmente vai fazer uma música medíocre, bem banal, porque falta o essencial. Agora, quem consegue, trabalha recursos antes inimagináveis, antes precisaria de uma orquestra inteira para o que se consegue com facilidade agora”, pondera Fritsch. Críticas sobre uma eventual preguiça das novas gerações com o processo de criação são rebatidas de imediato por quem tem um contato mais direto com o público jovem. À frente do curso de Produção Fonográfica da Unisinos, Frank Jorge revela que há uma troca de experiências frequente entre alunos e professores. “Não acho que essa geração seja preguiçosa. Tenho muitos alunos que são dessa geração e vejo muito potencial. Tendo a enxergar que cada geração tem os seus desafios. Acho que eles lidam de outra forma com as suas aspirações e seus desejos. Acho que têm bandas maravilhosas que fazem coisas usando o computador”, opina.

O mesmo Tom Morello, citado logo no início desta reportagem lamentando ter pouca concorrência em termos de heróis da guitarra, admite que tem buscado inspiração em sonoridades não necessariamente ligadas a um rock mais clássico, chegando a citar estrelas da música eletrônica como o produtor musical Skrillex. “Continuo em frente pensando que a guitarra pode servir de inspiração. Ainda que hoje em dia o meu padrão de influências venha mais de outros elementos. Mas acredito realmente que minhas formas de expressão são autênticas e que ainda há muitos álbuns para explorar essa linguagem”, afirma.

No caso do Brasil, especificamente, há um outro fenômeno que explica menos espaço para instrumentos como a guitarra. Ou melhor, dois fenômenos: o funk e a mais recente vertente da música sertaneja, classificada de sertanejo universitário. Ambos dominam completamente toda e qualquer parada musical no país. O primeiro se notabiliza pelo uso de batidas pré-prontas. Já no segundo, o que salta aos ouvidos é o uso de violões. Há ainda um terceiro elemento, não tão forte mas ainda assim importante, que é o crescimento de bandas gospel em cultos de igreja, o que contribuiu para um aumento nos últimos anos das vendas de violões e teclados.

A cena sertaneja é, acima de tudo, um exemplo de sucesso empresarial. Por onde passam, os shows estão sempre lotados. Em relação à venda de violões, calcula-se que 80% é para artistas e duplas do estilo. Obviamente, grande parte do êxito se dá porque é um gênero que caiu no gosto dos fãs, que adotam o mesmo visual de ídolos como Gusttavo Lima, Luan Santana, Paula Fernandes e a dupla Maiara e Maraísa. Por trás disso tudo, no entanto, os movimentos são muito bem calculados. No auge do sucesso do pagode dos anos 90, grupos como Raça Negra, Só Para Contrariar e Soweto disputavam todo e qualquer espaço na mídia. Enquanto a onda durou, o sucesso foi enorme, mas não havia uma base consolidada para uma eventual época de vacas magras. Onde o pagode falhou, o sertanejo universitário triunfou, criando uma rede de contatos entre os artistas, que ao invés de concorrerem, se apoiam mutuamente, garantindo exposição mesmo quando não há um trabalho a ser lançado.

A ideia é relativamente simples. O artista mais famoso apadrinha quem está crescendo e lhe dá espaço, convidando para parcerias. Quando não estiver tanto em evidência, é hora da recíproca. “O que a gente pode aprender com o sertanejo em relação à musica é a mesma lição dos sambistas dos anos 1940. Crescer em grupo dá mais sustentação à cultura. Quando não tem isso, você fica à mercê de um produto rápido e destrutivo”, explica Daniel Neves. Há quem tenha uma visão bem mais crítica sobre esse cenário todo, no entanto. “Hoje a música é muito corporativa, está aí um exemplo que é o sertanejo, que é uma extensão do agronegócio. Os caras investem dinheiro. Lógico, cai no gosto popular. Antigamente o jabá comprava horário numa rádio. Hoje eles compram a própria rádio e pagam para colocar nos programas mais expressivos”, avalia Marcelo Gross.

Aplicativos de computador ou mesmo para tablets (foto) possibilitam que mesmo quem não tem a mínima noção de teoria musical possa criar uma música e compartilhar ela com todo o mundo FABIANO DO AMARAL

Aplicativos de computador ou mesmo para tablets (foto) possibilitam que mesmo quem não tem a mínima noção de teoria musical possa criar uma música e compartilhar ela com todo o mundo

Estratégia semelhante está sendo adotada no cenário do funk e do pop nacional. Há algumas décadas, nenhum veículo era tão essencial para a divulgação de músicas do que o rádio. Hoje em dia, ainda que mantenha certa relevância, o mais importante para um artista permanecer em evidência é que ele esteja incluído nas playlists dos serviços de streaming como Spotify, Apple Music ou mesmo o YouTube. A alternativa para não ficar restrito a um gênero musical apenas então passa a ser circular por ritmos variados, usando e abusando de parcerias. E assim surgem parcerias como a funkeira Anitta e os sertanejos Matheus e Kauan, do sertanejo Wesley Safadão com o funkeiro Nego do Borel e outras do gênero. “Antigamente, tu tinhas o conceito de álbum e duas ou três músicas do disco eram escolhidas para irem às paradas. Hoje isso mudou e o que existe é o conceito do single”, observa Eloy Fritsch.

Outra característica da atual cena funk do Brasil é a concentração da produção em poucas pessoas, seja musical ou visual. O produtor Umberto Tavares é um destes casos. Apenas nos últimos dois anos ele é responsável pela composição e/ou produção de pelo menos 14 sucessos, que vão desde “Paradinha”, de Anitta, a “Você partiu meu coração”, de Nego do Borel, e “Sua Cara”, de Pablo Vittar. A agenda, ao que tudo indica é atribulada, já que o produtor sequer respondeu as dezenas de solicitações para conceder entrevista a esta reportagem.

Mesmo caso é aplicado à produção de vídeos, na qual Konrad Cunha Dantas, de 30 anos, é quase uma lenda. Diretor, produtor e roteirista, ele criou no ano passado a Kondzilla Records. Responsável pelos videoclipes de funk, é uma espécie de garantia de sucesso para quem está disposto a investir pelo menos R$ 50 mil. O retorno em termos de visibilidade é praticamente certo por um simples motivo: o canal Kondzilla é o quarto maior do YouTubeno mundo, com mais de 41,5 milhões de inscritos. Assim, basta ser divulgado lá para ver o número de visualizações ir à estratosfera. O clipe de “Bum Bum Tam Tam”, de MC Fioti, já teve até hoje incríveis 1 bilhão de views. Outro, “Olha a Explosão”, de MC Kevinho, alcançou 779 milhões. Para que se tenha ideia do significado da marca, basta verificar que o clipe mais visualizado da cantora Beyoncé, “Halo”, teve 729 milhões.

A relação dos brasileiros com o YouTube, diga-se de passagem, é inversa à maioria dos artistas estrangeiros. Astros internacionais como Lady Gaga e a já citada Beyoncé têm uma base muito forte de seguidores em serviços de streaming, mas não tão consistente no YouTube. Gaga tem 22,9 milhões de seguidores no Spotify e 11 milhões no YouTube. Beyoncé tem 25,3 milhões e 17,5 milhões, respectivamente. Para os brasileiros, a situação se inverte. O sertanejo Luan Santa tem 3,7 milhões de seguidores no Spotify, bem menos do que os 6,6 milhões no YouTube.

Pior para os artistas brasileiros que o YouTube paga bem menos na relação com os outros demais serviços. Dados atualizados de 2018 mostram os canais mais populares de streaming como Spotify e Apple Music pagam, respectivamente, 0,003 e 0,007 dólares por execução, enquanto o valor no YouTube cai para apenas 0,0007. Há, contudo, uma diferença essencial para explicar a predileção nacional pelo site de vídeos: é gratuito, enquanto os outros serviços requerem assinaturas.
Na prática, para ganhar dinheiro de fato com streaming, é necessário que o artista seja um nome estabelecido e de grande sucesso. Do contrário, o que vale mesmo é a visibilidade. “O Spotify ainda paga muito pouco. Não é uma remuneração justa, eles negociam direto com as gravadoras e não com os artistas.

É o único porém que eu tenho com as plataformas de streaming: o pagamento para os artistas e os autores poderia ser melhor. Já faz um tempo que venda de discos é algo que só rende para os grandes artistas. Para os pequenos e de médio porte é bem pouco, apesar dos direitos autorais renderem alguma coisa. O que vende mesmo são os shows, é o artista estar na estrada”, diz Marcelo Gross.
Para quem está começando, no entanto, mais importante do que ganhar dinheiro é ter sua música conhecida. Por isso, para Pedro Nascente, da banda Yellow Boulevard, criada a partir do curso de Produção Fonográfica da Unisinos, o retorno financeiro é o de menos neste momento. “Não é uma fonte de renda”, afirma o vocalista e guitarrista de 20 anos.

Apesar da idade e estar na faixa etária considerada nativa digital, o músico explica que a intenção do grupo é ir exatamente no caminho oposto. “É uma questão pessoal mesmo, tanto pessoal como coletivamente. O rock and roll clássico tem uma vibe melhor porque é analógico, é feito por humanos, a música fica mais real. Por isso temos três guitarras, bateria e baixo. A gente acredita que é mais puro”, define.

*Correiodopovo

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *