Mais do que apresentar ao público canções de um novo disco, o show, em muitos casos, representa um daqueles momentos de reencontro do artista com sua obra. É quando ele se debruça sobre a própria discografia, em busca de antigas canções que se conectem com as novas, e cria uma espécie de narrativa para a nova apresentação. Sempre foi assim para Djavan – e não foi diferente quando o músico começou a pensar no setlist da turnê nacional de Vesúvio, inspirada em seu 24º álbum, lançado no ano passado, e que estreou no final de março, em Santos (SP).

O show esteve em São Paulo em abril, onde o cantor e compositor se apresentou no Credicard Hall. “Sempre achei que o ideal é colocar no máximo metade de um disco novo, porque é importante essa troca. Quando a gente está no palco, está observando atentamente cada detalhe da plateia, o que está acontecendo, a reação”, diz Djavan, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, do Rio. “Tenho prazer de ver as pessoas felizes ali, no público, e quando há uma ‘barriga’ – que é aquele momento do show em que as pessoas se desconectam porque é uma música que elas conhecem pouco -, isso não é uma coisa agradável para nenhum artista. Mas, ao mesmo tempo, você tem de arriscar.”

Para Vesúvio, a turnê, Djavan selecionou, do novo trabalho, canções como Viver É Dever, Madressilva, Vesúvio e Solitude. Algumas delas, aliás, foram compostas sob o efeito do momento atual, no Brasil e no mundo. De alguma forma, as pessoas se manifestam na plateia quando ele as interpreta durante o novo show? “Elas reagem logo no início, porque o repertório é aberto com Viver É Dever, que tem essa interação com a atualidade, com a coisa política e tudo. Tem a Solitude também, e a reação é imediata, porque acho que consegui abordar esse tema de maneira objetiva por não ser uma coisa obscura, tentei trazê-la de uma maneira boa, otimista. Aponta as coisas, mas não fecha uma porta, eu digo que depende da gente, que a gente pode mudar tudo, e as pessoas se sentem muito envolvidas com a mensagem dita dessa maneira”, pondera o músico.

No entanto, uma grande parcela de sua apresentação é resultado de seu mergulho na própria obra. Há canções obrigatórias, como Flor de Lis e Oceano – “É quase que impossível tirá-las”. Eu Te Devoro é outro campeão de pedidos do público, por isso, quase sempre está em seus shows. “Flor de Lis, Sina, Lilás, Samurai são músicas que fazem parte de algo que não dá para mexer muito. A única coisa que faço é mexer nos arranjos, de maneira sutil, para não descaracterizar aquilo que as pessoas querem ouvir, mas elas estão sempre nos shows.” Há ainda as canções que, de tempos em tempos, retornam ao setlist, como Cigano e Acelerou.

Esperança

Os clássicos são sempre momentos esperados nos shows de Djavan, mas, para esta turnê, ele traz músicas especiais, que não cantava havia anos ou mesmo nunca tinha cantado ao vivo. “Quero-Quero, por exemplo, acho que cantei no lançamento do disco Novena (1994), há muito tempo. Eu queria um acento nordestino no repertório (do show) que não tinha. Não que seja uma música nordestina, ela tem elementos nordestinos. É uma música que lembra muito a atmosfera folclórica do Nordeste.”

Djavan trouxe também Esquinas, que não cantava havia 20 anos. “Fizemos uma enquete na internet para saber que música os internautas queriam ouvir no show e eles elegeram Flor do Medo”, conta. Essa escolha, aliás, o surpreendeu. Flor do Medo faz parte de seu álbum Vaidade, de 2004. “Flor do Medo, que há muito tempo não cantava, é muito pedida pelo povo e, quando perguntei o que as pessoas queriam ouvir no show, não imaginava que elas iam eleger essa canção, teve uma votação absurda.” Nuvem Negra é outra que Djavan nunca cantou. “É uma música que foi gravada por várias pessoas, que já teve gravações lindas, mas eu nunca tinha cantado, e agora coloquei no show.”

Mesmo ainda em início de turnê, o músico diz que já teve o feedback do público em relação à sua seleção. “As pessoas estão respondendo muito na internet em torno disso: ‘Poxa, nunca imaginei ouvir você cantar isso’. É algo que estimula bastante, porque todo mundo quer um frescor, quer poder cantar o que quer, e corresponder à ansiedade do público. Esse é o objetivo: é você transformar esse encontro num espetáculo, com interação entre plateia e palco. Quando isso se dá, aí é um show mesmo.”

Djavan compôs as canções de Vesúvio em um determinado momento do Brasil, num cenário de eleições, polarização. Como ele vê o País agora? “O Brasil está aprendendo a avançar. Acho que ainda tem um certo impasse na programação que visa a esse avanço, esse futuro”, diz. “Tenho esperança que em um momento a coisa destrave.”

Ao falar sobre esse tema recentemente, em um vídeo que foi ao ar no início do ano, afirmando estar esperançoso com o governo Bolsonaro, Djavan foi alvo de críticas. Sobre o episódio, ele diz: “Quando eu disse que tinha esperança no futuro do Brasil, é porque eu não sou capaz de torcer contra nenhum governo só porque não votei nele, porque o meu foco, a minha preocupação é o povo. Se o governo for mal, o povo vai mal, principalmente o povo mais pobre. Vou torcer sempre a favor de qualquer governo, porque meu interesse é exclusivamente o povo.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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