Referência incontornável do rock brasileiro (e não só) dos anos 1980, o cantor e compositor Agenor de Miranda Araújo Neto, o Cazuza, padeceu exatamente há 30 anos, em 7 de julho de 1990. Com o Barão Vermelho (banda que revelou Cazuza) e uma potente carreira solo em que misturou influências para veicular sua poesia de verve única, ele é adorado pelas gerações seguintes de músicos e artistas brasileiros.

Como uma pequena amostra dessa admiração, a reportagem entrou em contato com diversos artistas para que eles falassem sobre o que a vida e a obra do cantor representaram em suas próprias trajetórias e carreiras.

Bruno Brandão (da banda Coronel Pacheco):

“Apesar da tão popular carreira do solo do Cazuza, nossa relação com ele fica mais intensa ainda na fase com Frejat e cia. no Barão Vermelho. ??A estreia da banda e de Cazuza num disco gravado, em 1982, é pra gente um dos melhores primeiros discos de uma banda do rock nacional. Todas canções foram escritas por Cazuza (algumas em parceria com integrantes da banda) e mostra já um pouco de quem era o jovem vocalista que depois se transformaria num dos maiores ícones pop da vida nacional dos anos 80 e 90. Uma música que pra gente serviu até como referência duma fase mais roqueira do Coronel Pacheco é Billy Negão. Conta a história de uma suposta noite num bar do Leblon, que terminou de um jeito pouco agradável ao personagem. Bismarck, nossa música do 1º disco, talvez seja o nosso Billy Negão? Mas que se meteu em menores confusões. Cazuza sempre permeou nossos ouvidos e referências e, forçando um pouco a barra, podemos dizer que gostamos das mesmas coisas, afinal nós – o Coronel – e Cazuza, tocavam Eclipse Oculto do Caetano em seus shows.”

Clara Castro (cantora e compositora):

“Em 2018, lancei meu primeiro álbum, Caostrofobia, produzido por Rodrigo Campello e distribuído pela Som Livre em parceria com a Nomad Produções. Nesse álbum, gravei uma versão de Um Trem Para as Estrelas, de Cazuza e Gilberto Gil. Essa canção me lembra sempre o quanto Cazuza é atemporal e como suas palavras continuam reverberando em nossas vidas, principalmente nesses tempos loucos que estamos vivendo.”

Felipe Antunes (da banda Vitrola Sintética):

“Sinto que o Cazuza tem uma conexão muito profunda que se mistura com a história da música brasileira, e com os artistas. Cresci nos anos 1980 e 1990 e não participei como adulto e artista do auge dele, mas tenho uma memória afetiva desse tempo, do entorno. É muito bonito e potente sentir e perceber as consequências disso tudo na obra de cada um. Tenho uma identificação em várias vertentes da música que ele criou, mas tem uma coisa em especial: além da manifestação política (que já me chamava muita atenção, um burguês contestando a burguesia, além dos atos políticos em defesa da liberdade), foi a gravação em fita de Eu Preciso Dizer Que Eu Te Amo, foi muito impactante. Ouvir aquele k7 no momento da composição. Era um cara do rock, transitando por uma coisa mais parecida com a bossa nova. Aquilo foi muito poderoso. Essa gravação em si, essa composição, principalmente foi o que mais me pegou.”

Fernando Anitelli (d’O Teatro Mágico):

“Cazuza sempre foi uma referência transgressora, criativa e ousada. Fosse junto à sua família nos caminhos que ele queria para sua carreira, fosse dentro da própria carreira, saindo do Barão para fazer outra coisa, um roqueiro indo trabalhar com a bossa nova, dentro dessa outra música popular, dessa nova MPB, transgredindo junto àquela aristocracia carioca que dita o que é MPB até hoje. O Cazuza era esse bufão dentro do rock, pela ousadia, pelo jeito escancarado de trazer a real. Ele transgride junto ao público, quando fala sobre sua sexualidade. Ele era sempre esse lugar que instigava a inspiração, a transformação, a ousadia. Ele deixa isso claro na própria música e na poesia. Viva Cazuza!”

Ekena (cantora e compositora):

“Lembro até hoje quando, ainda bem pequena, eu escutava em casa minha mãe ouvindo Vida louca vida, vida breve, já que eu não posso te levar, quero que você me leve’, e ficava imaginando o que aquele cara queria dizer. Quando fui ficando mais velha, Cazuza se tornou um tipo de espelho de que eu podia ser. Mais tarde, ele virou uma paixão platônica quando ganhei um livro com alguns poemas não musicados dele. Eu fiquei por dias musicando e cantando, pensando que deveria pedir pra alguém me deixar gravar.”

Giovani Cidreira (cantor e artista):

“Cazuza é esse tipo de artista que a gente conhece sem conhecer, desde criança. A música está sempre no rádio, sempre tem alguém da família que gosta. No meu caso, antes de me interessar por música, já escrevia bastante verso. Alguém me disse que Cazuza além de cantor era poeta, então fui atrás das letras dele e escrevi várias coisas, até música, muito influenciado pelas letras de Cazuza. Uma coisa engraçada: os meninos do colégio, garotada, me apelidou de Cazuza, porque andava sempre escrevendo e com as letras dele embaixo do braço. No começo meu incomodei, até o dia em que eu comprei o LP O Tempo Não Para Ao Vivo e coloquei para tocar. Fiquei estarrecido. Tem umas coisas absurdas, como Só As Mães São Felizes. Não esperava uma liberdade tamanha. E a partir daí fiquei muito orgulhoso de ser identificado com ele. Levantou minha bola. Aqui em casa, sempre, sempre toca.”

Indy Naíse (cantora e compositora):

“Cazuza é um artista presente na minha vida desde a adolescência. Por inúmeros fatores me identificava com ele e sua obra. Sempre gostei dessa maneira de escrever poesia de um jeito escancarado e sedutor ao mesmo tempo. Fora a importância sócio cultural que toda sua obra traz. Era uma artista irreverente, com algumas contradições por fazer parte da elite do Rio de Janeiro, mas que foi muito necessário – e a frente, à sua época e que reverbera até os tempos atuais.”

Pedro Pastoriz (cantor e compositor, Mustache e os Apaches):

“Curto muito a música Bilhetinho Azul, do primeiro disco do Barão Vermelho, e desse jeito íntimo que o Cazuza conta a história. Tem uns vídeos muito engraçados do Cazuza no backstage, uma figuraça, gosto desse jeito provocador dele. É uma referência, certamente teria muito a dizer hoje em dia.”

Pélico (cantor e compositor):

“Impossível não amar o Cazuza. A gente não se cansa, não dá para se cansar. Poeta abusado, como todos os grandes poetas são. Não se verga, diz o que precisa dizer. (Cantando): O nosso amor é uma mentira, que a minha vaidade quer’. Corre todos os riscos. Eu tinha certeza que ele sabia que era impossível não amá-lo. Viva Cazuza!”

Tatá Aeroplano (cantor e compositor):

“Comecei a gostar quando eu era garoto, quando Cazuza estava no Barão Vermelho. Vi o clipe do Maior Abandonado. Foi uma paixão pela canção, muito forte. Fiquei pirando. Depois me marcou também o Barão Vermelho no Rock in Rio. Uma canção que me marcou muito na infância foi Pro Dia Nascer Feliz, essa música vem comigo até hoje. Quando faço discotecagens coloco nos setlists. Um artista fundamental para a minha geração.”

Tchelo Gomez (cantor e compositor, do coletivo Quebrada Queer):

“Lembro que algumas músicas me marcaram na infância, eu adorava cantar. E só depois de alguns anos, pude entender e interpretar as poesias e críticas musicadas, que fizeram muito sentido com o que eu estava passando por um período – me entendendo e me conhecendo melhor, principalmente sobre a minha sexualidade.”

Tio Wilson (Breno, baterista da banda Lagum):

“Falar do Cazuza é um motivo de muito orgulho. Sou de 1985, cresci ouvindo o rock de 80 e 90. Sem dúvida, um dos maiores compositores e poetas que o Brasil já teve. Poder representar um pouco dessa história para a nova geração foi um marco muito grande para mim: em um show nosso no Circo Voador, em que o Pedro, nosso vocalista, me chamou para cantar uma música. Escolhi Codinome Beija-Flor, um grande orgulho que tenho nessa história que a gente está apenas começando.”

*Correiodopovo

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